segunda-feira, dezembro 11, 2006

Camille, ma belle

Esse ano definitivamente foi o ano das mulheres. Não só na música, mas de uma forma geral. No Chile e na Alemanha, por exemplo, foram as mulheres que passaram a mandar no governo. Se formos ficar apenas no meio musical a coisa fica ainda mais séria. Beth Ditto (The Gossip), Lily Allen, Madonna, Britney Spears (bléarh!), Céu (quem?) e Lovefoxx foram alguns dos vários nomes que se destacaram ou, pelo menos, deram o que falar em 2006. Uma moça que poderia ser incluída nesta lista mas dificilmente se enquadraria no padrão "cool-hype-capa da NME" é uma cantora chamada Camille Dalmais, mas que assina apenas Camille. Ela é francesa, tem 26 anos e lançou um dos discos mais espetaculares do ano.
Dona de uma voz encantadora, que às vezes lembra a Björk, ela é daquelas cantoras que você se apaixona logo na primeira audição. Pouca gente sabe mas ela inclusive veio ao Brasil este ano para se apresentar no festival Abril pro Rock em Recife além de passar, se não me engano, por São Paulo também. E me pergunto: como ninguém divulgou, fez entrevista ou sequer deu importância pra ela? Que absurdo!
Ela desembarcou em terras tupiniquins para divulgar o disco "Le Fil", lançado lá fora em 2005 mas apenas este ano no Brasil. O disco tem como conceito (pelo menos foi o que eu entendi) a vida, através do tal fio do título. Nas apresentações ao vivo o palco é literalmente atravessado por um fio branco que separa a cantora da platéia. Além disso, Camille vai se riscando durante o show. Durante algumas músicas ela simplesmente pega uma caneta e começa a desenhar um fio no próprio corpo. Ao final da jornada não se sabe mais onde começa e nem onde termina o desenho.
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No disco o tal fio é representado por um zumbido suave e intermitente que só é percebido nos momentos de silêncio ou durante a transição entre uma faixa e outra. A sonoridade do disco vai das tradicionais "chansons" francesas dos anos 30 e 40 passando pelo folk, pop francês da década de 60, bossa nova e experimentalismos. O disco anterior da cantora, "Les Sacs de Filles" (lançado em 2002), vendeu cerca de 300 mil cópias na França (um verdadeiro fenômeno) e fez de Camille uma verdadeira febre. Já até colocaram a moça dentro de um movimento chamado 'nouveau chanson'. Em março deste ano Camille ganhou dois prêmios Victoires (tipo o Grammy francês) por melhor perfomance ao vivo e disco do ano por "Le Fil". Ela também participou do projeto Nouvelle Vague que consistia em um disco com releituras de clássicos do punk e pós-punk. Ela fez uma versão mezzo sexy mezzo chanson de "Guns of Brixton" do The Clash que, por sinal, você pode ouvir aqui.
A vontade de inovar e ser diferente é que se torna a cereja do bolo no trabalho de Camille. Muitas vezes não é possível identificar quais instrumentos compõem as músicas, às vezes dá a impressão de se ouvir um baixo de repente esse baixo já é um violoncelo, depois parece um sintetizador e depois você acaba se surpreendendo e percebe que o tal som foi feito... com a boca!
Camille é acompanhada no palco por mais dois caras que se encarregam de tocar piano, baixo, bateria, sintetizadores e fazer sons estranhos com a boca, bater palmas, estralar os dedos, bater no peito, este tipo de coisas. Sabe aquele grupo de São Paulo, o Barbatuques? Então, mais ou menos esse esquema. E o melhor de tudo é que toda essa maluquice se encaixa perfeitamente e resulta num pop delicioso pontuados pelo lindo sotaque que só a língua francesa proporciona.
Músicas como "La Jeunne Fille Aux Cheveux Blancs", "Assise", "Pour Que L'amour Me Quitte" e as vinhetas "Janine I", "Janine II" e "Janine III" parecem terem sido compostas para alguma companhia de balé ou coisa parecida tamanha é a delicadeza apresentada ali e tamanha é a consciência de Camille no que diz respeito à sua voz.
"Vertige", por exemplo, começa com um jogo de vozes que simula pingos d'água que, se ouvidos com atenção, realmente causam certa vertigem no ouvinte. Além disso "Ta Douler" (clipe aqui), "Vous", "Baby Carni Bird" (a única cantada em inglês), "Au Port" (clipe aqui) são verdadeiras pérolas pop, de acordo com o que "pop" significa para Camille, é claro. Se você tiver que ouvir duas músicas para verdadeiramente se apaixonar pela moça, vá atrás de "Quand Je Marche" e "Rue de Ménilmontant", perfeitas para se imaginar caminhando pelas ruas de Paris durante a primavera. Se você não se emocionar com isso, procure um médico.
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* Veja a sensacional performance de Camille em "Ta Douler" no programa Taratata da tv francesa.
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* Camille cantando "Au Port" no mesmo programa.
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